Da mesma forma que uma adolescente acometida da bulimia (ou de qualquer outra dessas doenças pós-modernas, como a oneomania, a doença do consumo), só poderá ser tratada se admitir-se doente, também a nossa sociedade só poderá ser remediada se se admitir cronicamente patológica. Não sofremos apenas de excesso de egoísmo, narcisismo, hedonismo e estultia. Também falta um nome mais apropriado para essa mania de auto-enganação, para essa carnavalização do desastre. E agora as novas gerações não miram mais a máquina fotográfica na paisagem que há para além de si: miram em si mesmas. É o império da auto-imagem, numa era em que supostamente estamos aptos a lidar com o outro. E onde está o outro, se só temos olhos para nós mesmos? Somos já todos os outros de nós mesmos.
Bastamos-nos! E, no entanto, vivemos enfiados em paradoxos: dizemos viver o império da liberdade, e dormimos em cárceres que nós mesmos construímos: cárceres domésticos; prisões domiciliares. Temos medo! Império do medo e da insegurança! Qual liberdade?
Dizemos que vivemos uma "sociedade da informação", ou "do conhecimento", e nos deparamos cada vez mais com as gerações do tipo "sei-que-lá-sei-que-lá". Tipo assim: "ah, sei lá!" Que confunde rebeldia com aquela coisa enlatada que se estende desde a TV ao DVD, e até as lojas, papelarias e salas de aula como mero objeto de consumo! Aliás, já perdemos a capacidade de discutir e de pensar a qualidade. Agora que tudo virou mero consumo, que tudo foi entregue ao mercado, só há uma regra: a da quantidade! Só conseguimos enxergar números, quantidades, massas consumidoras. Tudo o mais é abstração desprezível! É uma pena! E, talvez, o principal sintoma de nossa patologia.
Mas, ainda assim, continuamos nos encantando com os desertores da ordem do primeiríssimo mundo, que migram para cá para cair na bagunça, gozar com a nossa cara, e tentar nos convencer de que nosso caos lamacento e fedorento é sim o prenúncio do paraíso. Enquanto continuarmos nos enganando com a forma como os loucos do primeiro mundo nos olham, não conseguiremos mirar nossa própria loucura. E já perdemos a medida de tudo, e nem mais enxergamos os descaminhos de nossa barbárie! Se já confundimos tanto liberalismo com liberdade, é porque copiamos rapidamente os padrões dos outros, e pelo menos em parte nossos problemas devem-se a isso. Certamente estamos diante de uma necessidade profunda de revisão de nossas premissas civilizatórias. Admitir isso é um passo para pensar nos rumos que podemos nos dar, e ao nosso futuro!
Josemar da Silva Martins (Pinzoh)
Professor no DCH III/ UNEB
16/02/2007
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